De mão na mão
De mão na mão. Foi assim que fizemos a viagem de regresso a Lisboa dois dias antes de tu partires. Viémos os quatro de táxi, eu sempre junto de ti, com a mão enlaçada na tua, de ombro encostado ao teu. Passávamos pelas árvores, pelas serras, galgando a estrada imensa de alcatrão que ficava cada vez mais distante. As duas, pela última vez.
Lembro-me dessa viagem como se tivesse sido ontem. Parámos para fazer chichi e para comer melão. Voltámos para dentro. A viagem que antes fazíamos de combóio fizemos, desta vez, de carro. Não havia tempo a perder e todo o conforto era necessário. Mas nós as duas parámos, aquela viagem cristalizou as horas, fê-las estender até ao infinito. Os outros não estavam ali, eramos só nós. A duas. Não voltaria a ver-te, agora sei.
Fomos a viagem inteira a apertar a mão uma da outra. Creio que fui eu que comecei, para saber que ainda estavas comigo. Tu respondias, apertavas a minha com carinho, e eu teimava e tu voltavas a responder. Horas nisto. Em silêncio, na nossa linguagem própria, feita de gestos e sentimentos que tão bem entendíamos. É a recordação mais doce que tenho comigo. A despedida que fizemos uma da outra, em silêncio, longamente. Penso que ninguém o soube. Que ninguém o sabe ainda. Eu não contei, e tu?
A última imagem que tenho tua foi debruçada no corrimão, à porta da casa onde passei tanto da minha infância, a abraçares-me com os olhos, a dizer-me adeus para sempre. Não voltaria a ver-te, agora sei.
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