Projecto âncora
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Cartas à minha avó: maio 2007

23 maio, 2007

A moda é... privatizar!

A moda agora é... privatizar!

Não se assustem. Não vou privatizar. Este blog já é tão restrito e tão pouco lido (e digo isto sem ponta de dor de corno ou algum tipo de pena) que não valeria a pena privatizar.

Medito sobre o assunto prestes a irritar-me, a indignar-me, a soltar desabafos, críticas mais ferozes e depois... Depois 1, 2, 3 - inspiro, expiro, solto um sorriso e concluo que realmente cada um faz o que quer com a sua vida e cada um põe, dispõe e expõe aquilo que bem entender. Mas cá dentro, pensando no assunto com seriedade, há qualquer coisa que me faz comichão, que me provoca um friozinho na barriga.

Quando me iniciei no mundo dos blogs foi pela leitura de alguns chamados "babyblogs". Primeiro pelo fascínio que sempre tive pelo mundo infantil e pela maternidade. Depois quando chegou a minha vez e tudo me parecia tão assustadoramente novo que me servi de alguns deles para sorver toda a informação que julgava (e continuo a julgar) não encontrar nos livros. E aos poucos, devagar, o hábito foi-se tornando diário. Dei por mim a abrir os mesmos blogs dia após dia, quase pela mesma ordem e a interessar-me pelo quotidiano de pessoas como eu, com dúvidas existenciais como eu, de carne e osso, tal e qual. E assim, de mansinho, entraram para a minha pequena família virtual, aquela família que nós escolhemos, que não nos é imposta pela vida. Apenas num caso a situação extrapolou para a "realidade" e essa pessoa passou dos afectos virtuais aos afectos efectivamente reais numa questão de instantes. Mas esta excepção à regra daria (e dará, concerteza) origem a muitas dissertações emocionadas e não é dela que falo agora. Falo, sim, dos blogs que eu costumava visitar diariamente, em que as portas estavam sempre abertas, onde, a maior parte das vezes, nem sequer comentava, mas que lia com interesse desmedido. Agora dou pela maior parte deles privatizados, alheios à minha leitura, tementes de pedófilos e pessoas mal intencionadas que, bem sabemos, abundam na internet. Desculpem-me, não peço permissão para entrar. Recuso-me a mandar um mail a pedir, por favor, acesso de entrada na vossa vida. Quem sou eu, de facto, que legitimidade tenho para que ma concedam?... Este facto não me choca, só me entristece.

O que me choca mesmo é que muitas destas pessoas não tenham ponderado antes acerca da privacidade/segurança das suas crianças. O que é que muda depois do rapto da pequena Maddie? Nada. Tantas crianças são raptadas todos os dias, já soube de tantas situações ocorridas no Colombo em que as crianças são levadas, rapam-lhes o cabelo na casa de banho, drogam-nas e depois são levadas ao colo, como se de suas filhas se tratassem. Isto já acontece há tanto tempo...

Sim, já tive um blog em que falava da minha gravidez. Deixei-o assim que o meu filho nasceu. Não só por causa da questão da segurança, mas porque não era eu, confinada a um espaço em que só se debatem fraldas e chupetas. Esse não era o meu registo. E depois, quem sou eu para expôr a vida da minha família? Eu penso assim, atenção que não tenho nada contra quem pensa o contrário. Mas o que me faz comichão mesmo a sério é que as pessoas só acordem agora para esse tipo de situações. E pior, incutir medo às crianças quando os pais fizeram aquilo que nunca se deveria fazer: deixar 3 crianças sozinhas a dormir enquanto jantavam.

Resumindo: agora que a moda é privatizar digo a todos os que fecharam as portas "Have a good life!". Mas em jeito de conclusão rebato: já não posso com tanto "Privatizámos"...

22 maio, 2007

Nº 500 Chegue-se à Frente!

Nº 500 chegue-se à frente.
Nunca eu pensei ter leitores, muitos menos estar quase a chegar às 500 visitas... Este blog foi criado com o intuito de me ler a mim própria, de reflectir comigo mesma. Realmente os meus desabafos interessam a quem? A QUEM?...
Volto a repetir: Nº 500 chegue-se à frente. Acrescento: dá-se recompensa!

11 maio, 2007

Ultimamente

Ultimamente sinto-me invadida por um desalento, com os olhos bem abertos, com os sentidos bem dispertos, lúcida, sóbria, desenganada. E o que vislumbro não é, de todo, o que pensei algum dia encontrar: vejo-me sozinha, acompanhada na carne, desacompanhada na alma e no coração.

Se, por um lado, cá dentro algo me diz que é um compasso de espera, a cabeça manda-me seguir meu caminho pelos meus próprios pés. Quem quizer que me acompanhe ou fica para trás. E sinto-me tentada, todos os dias, a fazê-lo. A voz do meu filho fala mais alto e uma réstia de qualquer coisa que, em tempos, me fez feliz ainda ecoa, ao longe. Não sei bem o que é. Já não me lembro há quanto tempo não sou feliz, assim, com as letras todas, e em todas as instâncias do meu ser. Feliz, por inteiro. Não apenas feliz como mãe. Isso sou-o todos os dias desde que o meu filho nasceu.
Já não me lembro sequer de como era quando era feliz. Será que alguma vez o fui? Sinto-me como um barco perdido no nevoeiro, sem saber muito bem por onde ir, para onde avançar. O farol que me iluminava foi-se extinguindo, ao longe, e preciso encontrar uma luz dentro de mim que me guie e que me leve a porto seguro.

09 maio, 2007

Chamem-me o que quizerem

Chamem-me o que quizerem, mas desde que fui mãe tornei-me mais tolerante nalgumas coisas mas mais rígida e inflexível noutras tantas.

Algum dia eu jantaria tranquilamente quando os meus três filhos menores dormiam sozinhos em casa? NÃO! - O meu sempre me acompanhou para todo o lado e dormiu grandes sestas em restaurantes, devidamente instalado no seu carrinho.

Algum dia eu fui pôr gasolina no carro e deixei o meu filho sentado dentro do mesmo enquanto eu me dirigia à caixa para pagar? NÃO! - Nem que estivesse a dormir, levantava-o e levava-o comigo.

Algum dia eu tirei o ovo do carro e dei a volta ao mesmo para fechar as portas, deixando o meu filho do outro lado, ou sequer virando-lhe as costas? NÃO! - Sempre me afligiu perdê-lo de vista ainda que fosse por um segundo.

Algum dia deixei o meu filho vaguear pelo supermercado enquanto a minha atenção se desviava para a escolhas dos produtos a comprar? NÃO! - Ou vai no carrinho ou pela minha mão. Se me fugir ou leva uma palmada ou uma advertência, estando mesmo nas tintas para os olhares reprovadores das outras pessoas.

Eu não deixo o meu filho sozinho nem para ir pôr o lixo à rua, num milésimo de segundo ele pode fazer mil e um disparates que lhe vierem à cabeça... As crianças não têm noção do perigo, cabe-nos a nós vigiá-las e prepará-las para, um dia mais tarde, podermos ter confiança nelas e, então sim, darmos-lhe espaço e responsabilidade para voarem sozinhas.

Uma criança de 3/4 anos deveria ter sido deixada a dormir em casa com dois irmãos mais novos sem supervisão de um adulto? NÃO!

Que sentido de responsabilidade têm estes pais?
Sou a mãe perfeita? NÃO! - Muito longe disso, até. Mas tento, pelo menos, não ser negligente porque tenho noção que azares acontecem até às pessoas mais vigilantes.

Desculpem-me os mais sensíveis, mas dos pais não tenho pena. Foram os próprios que motivaram/facilitaram o desaparecimento de Madeleine. Tenho pena da menina, isso sim. E dos outros irmãos, que sabe Deus quantas vezes não foram deixados sozinhos em casa... A sorte dos pais foi não terem levado os três...

03 maio, 2007

Pensei

Pensei que já não me doesse tanto. Pensei que o tempo me permitisse não chorar. Pensei que, 365 dias depois, a razão levasse a melhor sobre a emoção. Enganei-me. Hoje, como há um ano, volto a chorar por quem não conheci. Hoje, como há um ano, volto a imaginar a dor dos outros e a ficar dobrada sobre mim mesma. Hoje, como há um ano, volto a perguntar como foi possível.

Mas o que eu sei que há um ano não sabia é que é possível construir uma casa, tijolo a tijolo, após uma derrocada. Lentamente, sofridamente, muitas vezes com desalento. O que eu sei, porque alguém me ensinou, é que é possível sorrir ainda que se esteja a morrer por dentro. E quem dá lições destas não são pessoas comuns. São pessoas de alma grande, que abarcam o melhor o e pior dentro do peito, mas cujo brilho dos olhos nos diz que a vida vale sempre a pena.

Um ano depois também eu mudei. Comovo-me mais com certas coisas, aflijo-me mais com outras. Sou mais exigente, também, nalguns aspectos da minha vida. Acredito que há coisas que, realmente, não merecem o meu tempo nem a minha atenção. Um ano depois também eu mudei. Ainda que não te conhecesse. Estás em mim como se me conhecesses desde sempre.

Sinto-te ou "Pequena Homenagem a Laura Lourenço"

Sinto-te na brisa que passa suave,
na água que teima em cair
sobre a terra.
Olho para o céu e tenho a certeza,
são os teus olhos,
azuis,
que me observam.
Sinto-te na relva que cresce ao sol,
nas nuvens que passam,
uma e outra vez.
Sinto-te e sei
que vives com os anjos,
por certo sorris,
que brincas,
talvez.
Sinto-te em mim
num sítio sagrado,
num jardim de cores
distante do mundo.
Porque me chamaste,
se não te conheço?
Porque me acordaste
de um sono profundo?
Dizes que estás bem
pela minha voz.
Por isso me comovo.
Por isso agradeço.